Uns sapatos que ficam bem numa pessoa são pequenos para uma outra; não existe uma receita para a vida que sirva para todos.
(Carl Jung)
Era o ano 2012 quando eu defendi minha tese de doutorado sobre mulheres gerentes. A temática da mulher nas organizações já vinha ganhando espaço em pesquisas acadêmicas há algum tempo, acompanhando a crescente participação da mulher no mercado de trabalho após a década de 1970. Predominavam estudos sobre as desigualdades, discriminações e desafios enfrentados por essas mulheres no contexto da empresa. Minha tese foi o primeiro estudo mais recente na FGV no tema, considerando os anos de 2010, e minha pesquisa se concentrou em olhar para a mulher gerente e os sentidos que ela atribuía ao seu trabalho, sua vida e a si própria.
No ano de 2022, meu trabalho ganhou formato de livro. São inegáveis os avanços nesta última década quanto a um maior protagonismo da mulher no mercado de trabalho e na sociedade de forma geral. Por outro lado, é curioso observar que os temas que eu havia tratado há dez anos continuam muito atuais e pertinentes para discussão. Questões sobre a dificuldade à ascensão a cargos mais altos, a inserção da mulher na empresa e nas dinâmicas organizacionais moldadas pelo masculino, os desafios da relação trabalho-família foram e ainda são temas discutidos em diferentes esferas.
Mas por que esses elementos se apresentaram à mulher no contexto do trabalho e, principalmente, por que continuam presentes? Vamos voltar algum tempo na história para compreendermos essa dinâmica.
Ao final do século XIX, com o crescimento das indústrias, a produção doméstica migrou para a produção industrial redefinindo a relação entre público e privado. Atividades antes desenvolvidas dentro de casa, como a costura e a panificação, por exemplo, migraram para o formato comercial na indústria e, assim, a família deixou de ser uma unidade de produção e passou ser consumidora. Isso se traduziu na necessidade de se ganhar o suficiente para o sustento da família, papel assumido pelo homem como provedor (ALVESSON &; BILLING, 1997), que passou a receber um salário. Por consequência, ocorreu uma desvalorização do trabalho da mulher feito em casa. Assim, o conceito de trabalho passou a estar vinculado ao gênero, em uma relação desigual: a esfera do trabalho passou a ser a esfera masculina com um status superior ao trabalho da mulher, que estava vinculado à esfera doméstica (HOLLWAY, 1996).