Muito se fala sobre a maternidade nas organizações: a evolução da carreira da mulher pós maternidade, as habilidades que as mães desenvolvem após o nascimento dos filhos, os desafios da equidade salarial entre homens e mulheres, o percentual de desligamentos pós licença maternidade e tantas outras questões que envolvem as relações de trabalho da profissional.
Como mãe, psicóloga e profissional de Recursos Humanos, coleciono vivências e histórias que me permitem trazer à luz outros tipos de reflexões pouco discutidas pelas mulheres e pelas organizações: os impactos subjetivos da jornada da maternidade, que podem envolver o planejamento e desafios para a mulher engravidar, a fase da gestação ou os reflexos da perda de um bebê, como exemplos.
Para melhor ilustrar esta jornada, trarei relatos pessoais e reflexões de outras mulheres, práticas corporativas de acompanhamento da maternidade e estatísticas que auxiliarão a corroborar o cenário atual.
A gestação não planejada
Poucos meses após assumir um desafio em uma grande organização, que coincidiu com o início do meu namoro, engravidei. Naquele momento, fui tomada pelas incertezas da reação da minha liderança em relação à gestação. Como eles iriam avaliar uma mulher que engravida logo que entra na empresa? Eu ainda não tinha desenvolvido relações que me possibilitavam compartilhar a notícia, sem medo do julgamento.
As primeiras semanas foram intensas, com hormônios e ansiedade à flor da pele. Sempre quis ser mãe, mas aquele definitivamente não parecia ser o “melhor momento” para gerar um filho. Sentia enjoo durante os almoços, não pude tomar um vinho na celebração de fim de ano, o sono parecia incontrolável. Além de não me sentir confortável para dividir este momento pessoal com os novos colegas, eu vivenciava a insegurança natural pelo futuro familiar que estaria por vir.
Em paralelo, eu lidava com uma nova cultura organizacional em meio a diversos projetos que estavam sob minha responsabilidade. Infelizmente, na semana em que eu completei doze semanas, o exame morfológico mostrou que minha gestação não havia evoluído. Era véspera de Natal e tínhamos combinado uma pequena celebração em equipe. Naquele dia, dei uma desculpa qualquer e fui para casa. Em meio ao luto pela perda, a expulsão do embrião só aconteceu depois de algumas semanas. Mais uma vez, permaneci calada, procurando não demonstrar medo de que este processo ocorresse no escritório (quem já passou por um aborto, infelizmente sabe do que estou falando).
Passados alguns anos, hoje reflito se eu não deveria ter compartilhado a notícia da gestação e perda com meu líder da época. Eu poderia ter tornado a experiência (tanto da alegria como da dor) mais leve. Poderia ter evitado a sensação de incapacidade profissional, misturada com tantas outras emoções. Mas escolhi manter este acontecimento em segredo, durante toda a minha trajetória na empresa.