Corpo e mente nunca foram separados. Nos últimos 30 anos as interações biológicas entre eles têm sido estudadas pela psiconeuroimunologia, área de pesquisa que investiga as relações multidirecionais entre emoções ou pensamentos e respostas fisiológicas, integradas por mediadores dos sistemas neurológico, endócrino e imune. Sob esta abordagem multidisciplinar - que envolve psicologia, neurociências, medicina comportamental, fisiologia, imunologia e genética - saúde e qualidade de vida são consequências das experiências que vivemos.
A conexão entre saúde e percepção das experiências vividas faz bastante sentido. Todo indivíduo tem características que existem num contexto social, histórico, cultural, e, assim, está sujeito a moderadores psicossociais, hereditários (genética) ou resultantes de comportamentos aprendidos (epigenética). Esta combinação entre o indivíduo e seu meio molda padrões de percepção de estresse e de enfrentamento. Estes padrões por sua vez se manifestam na ativação de vias biológicas de resposta que envolvem neurotransmissores (como a serotonina, cujos níveis reduzidos estão associados a depressão, ou a dopamina, associada a recompensa), hormônios (como cortisol e adrenalina, mediadores das respostas de estresse) e citocinas (mediadores do sistema de defesa imune). Trocando em miúdos, a saúde de uma pessoa - que se traduz em saúde física e também em funcionamento psicossocial e qualidade de vida, é resultado de processos que envolvem além da bagagem biológica e comportamental herdada, apoio social, comportamentos e estilo de vida.
Neste contexto, burnout é uma condição caracterizada pela resposta a estressores crônicos associados a trabalho, de conteúdo emocional e interpessoal, que podem levar tanto à exaustão emocional como à indiferença social ou à insatisfação com o trabalho. Fatores individuais, como traços de personalidade e vida familiar, influenciam quem vivencia o esgotamento profissional. Ainda que não considerado um diagnóstico médico, burnout tem sido associado a distúrbios de sono, sintomas depressivos, consumo de álcool e drogas, que por consequência favorecem o desenvolvimento de condições crônicas como hipertensão e diabetes, e a um aumento de vulnerabilidade para doenças, especialmente cardíacas. Burnout, portanto, tem um impacto que vai além da saúde mental.
Um estudo da Winona University (1) propõe dividir o processo de burnout em cinco estágios, sendo que a crise de fato só acontece no penúltimo. É um alerta para a necessidade de se buscar estratégias de enfrentamento para situações de estresse desde o início do processo de burnout. O primeiro estágio é chamado de fase de “lua-de-mel”, quando o engajamento, alta produtividade e compromisso com o trabalho vêm acompanhados de um excesso de responsabilidades assumidas. Poucas pessoas reconhecem este estágio como o início do burnout, e não buscam estratégias positivas de adaptação. No segundo estágio, a consciência das dificuldades em lidar com o estresse está aumentada, e se manifesta na insatisfação com o trabalho, em problemas de sono, sintomas depressivos e compulsões. No terceiro estágio, os sintomas que eram eventuais passam a ser crônicos, incluindo exaustão, raiva e depressão. No quarto estágio, caracterizado pela crise – o burnout propriamente dito, os sintomas passam a ser não só crônicos, mas críticos: além do aumento de frequência e/ou gravidade dos sintomas físicos, aumentam posturas de pessimismo, dúvidas sobre o próprio valor e atitudes de escape. Excessos ao comer, beber, fumar, usar drogas, e assistir séries na televisão são exemplos do escapismo que acompanha os últimos estágios do burnout. Estas posturas refletem uma falta de autorregulação, ou seja, falha a habilidade natural de monitorar e modular a emoção, a cognição e o comportamento, para se adaptar às demandas em situações específicas.