O voluntariado surgiu no Brasil no século XVI, através de organizações religiosas. Na sua maioria católicas e ligadas à saúde – as chamadas Santas Casas – influência da Coroa. Temos notícia que a primeira Santa Casa de Misericórdia foi implantada em 1543. Era um trabalho essencialmente das mulheres. As primeiras políticas públicas datam da década de 30, que passou a regular as instituições filantrópicas. Quando falamos em assistencialismo lembramos da roda, onde eram colocados os bebês indesejados. Não existia de fato a ideia que temos hoje de trabalho voluntário. Falávamos em doações, assistencialismos.
Mas um fato na década de 90 veio a modificar totalmente o trabalho voluntário no Brasil. Por volta de 1993 o sociólogo conhecido como Betinho se perguntou: “E como desenvolvemos tanta tecnologia, ganhamos tantos poderes e aceitamos que seres humanos morram de fome?” Quando fez essa pergunta de forma tão despretensiosa, ele levantou o lençol da globalização, que esconde a Idade Média, que ainda persiste no planeta. Você que é mais jovem pode se perguntar: quem foi Betinho? Que importância ele teve na nossa história para aparecer aqui num artigo que fala de voluntariado?
Eu te conto um pouco: Betinho era um filho hemofílico de Minas Gerais, irmão de outros dois hemofílicos. Todos os três morreram por causa de uma transfusão de sangue contaminado no Rio de Janeiro (os hemofílicos precisam fazer transfusão de tempo em tempo). Todos adquiriram AIDS. O mais velho chamava-se Henfil, o cartunista que criou a famosa Graúna. Era um dos críticos do nosso período ditatorial, até hoje muito comentado pelos jornalistas e designs. O segundo era Betinho que tomou um caminho diferente, se tornou um pensador sobre as misérias desse continente tropical. O mais jovem era músico, Chico, que acabou morrendo antes de Betinho, que apesar de muito magro e com todos os sintomas das doenças acordadas pelo vírus da AIDS, parecia que nunca ia morrer de verdade. Existem livros sobre a vida dos três, cada um foi marcante na área de trabalho que escolheu. Betinho lutou contra a AIDS. Contra o forte preconceito que existiu contra a doença naquela época.
Aqui, para nosso tema vamos precisar relembrar Betinho porque ele foi fundamental na ampliação do trabalho voluntário no Brasil, esse país que talvez não se morra de fome, mas se vive com fome. Aliás nesse momento que voltamos ao mapa da fome da ONU parece b em adequado para lembrarmos a Ação da Cidadania, uma campanha de ação e comunicação que ajudou o Brasil a sair do mapa da fome no início dos anos 2.000. Em muitas partes do mundo se morre de fome e isso nos parece normal, pelo menos aceitável. O mundo não conheceu Betinho, nem todo o mundo. Hoje muitos não conhecem. Ele tinha inúmeras facetas, era uma pessoa multidisciplinar, um articulador e inovador.