Falar de espiritualidade e psicologia é um grande desafio, em função de sua proximidade com a religião, e a psicologia atrita com isto. É preciso que se diga que a religião é, talvez, a mãe da espiritualidade, mas há quem pense o contrário.
Se em linhas gerais pode ser difícil falar de espiritualidade e psicologia, não há essa dificuldade no tocante a psicologia transpessoal. Mas a psicologia vai, então, atritar com a psicologia transpessoal, que é quase amaldiçoada no campo em função de seu aberto diálogo com as práticas religiosas. Esta é, portanto, a encrenca na qual entrei ao aceitar o convite para escrever este artigo, que espero, possa trazer alguma contribuição para você, caro leitor.
Vamos iniciar nossa conversa falando da origem desse atrito.
Quando a ciência surgiu no século XVII na cultura ocidental, este fenômeno promoveu uma ruptura definitiva no corpo da tradição católica, que já havia sido partida anteriormente no “protesto” de Lutero e Calvino, entre outros, em um processo que teve sua origem antes mesmo do cristianismo e que remonta à filosofia grega. Surgiu, então, naquele momento histórico o que chamamos hoje de religião, que é uma invenção do Ocidente. Assim, os conhecimentos foram classificados em quatro categorias: científicos, religiosos, filosóficos e do senso comum.
Apenas para esclarecer o que chamamos de tradição ou saberes tradicionais: trata-se de um corpo holístico integrado de conhecimentos e práticas, que envolve dimensões religiosas, filosóficas, científicas e artísticas. O Brasil possui muitas tradições de conhecimento, materializadas nas culturas dos muitos povos indígenas que habitam seu território. Assim, na prática do pajé, não há separação entre ciência, religião, filosofia e arte. O mesmo acontece no Oriente, no taoísmo, por exemplo. Não existe, portanto, “filosofia taoísta”, mas conhecimento tradicional taoísta, que reúne as mesmas características holísticas dos conhecimentos tradicionais das etnias indígenas em nosso país.