Crianças culpam, reclamam e brigam, adultos resolvem. Essa é uma das frases mais simples e esclarecedoras para descobrir o nível de autoconsciência de qualquer indivíduo, independente da classe social, escolaridade, idade, gênero, sexo, religião, profissão ou país onde mora. Uma forma de reconhecer facilmente quem teve uma história de vida sofrida e difícil, provavelmente repleta de violência física e mental, com pouco ou nenhum acesso ao autoconhecimento. Uma ferramenta essencial para reconhecer, cuidar e integrar as inúmeras crianças aprisionadas dentro de todos nós, adultos, que são carregadas de um lado para outro, todos os dias, para podermos nos relacionar com as outras pessoas.
Essas crianças são memórias de dor encapsuladas no tempo, presentes a maior parte do tempo nas relações que mantemos em nossos cotidianos. Memórias nascidas pela vergonha de uma criança que foi criticada ou comparada com outras crianças melhores que ela, pela injustiça de ter apanhado fisicamente de quem se esperava apenas amor e proteção, pelo medo de presenciar discussões e brigas entre os pais, pelo sentimento de abandono pela ausência de quem deveria estar presente para dar carinho e atenção, pela dor da rejeição de não ter escutado um "eu te amo", pela traição de uma mãe que não a defendeu de um pai agressivo, pela culpa causada pela falta de dinheiro em casa e por aí vai uma lista infindável de dores que todos nós carregamos, a maior parte inconsciente.
E olha que até aqui nem chegamos próximo das memórias de dor mais aterrorizantes, que são muito mais comuns do que imaginamos e estão presentes bem ao nosso lado, sem percebermos. Portanto, para que isso tudo fique ainda mais claro, tenha em mente que todo julgamento, mesmo que apenas em pensamento, vem de um lugar no passado onde essas dores se originaram. Essa compreensão permite entender a profundidade de uma ferida pela força de um julgamento necessário para protegê-la. Seja ele expresso verbalmente, fisicamente ou em silêncio absoluto. A mesma força das polaridades presentes na política, que só revelam horrores vividos por suas crianças.